O país da saída temporária de presos, audiência de custódia e auxílio-reclusão apresenta mais um bizarrice à população: a chamada Lei de Abuso de Autoridade, que entrou em vigor na última sexta-feira.
O resumo é que ela é boa para criminosos e ruim para quem os prende. “O bandido tá rindo com isso”, resumiu um policial com quem conversei sobre o assunto.
A lei teve origem no Senado e foi sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro com 33 vetos, ainda no ano passado; o Congresso, no fim, derrubou 18 desses 33.
São muitos os pontos que podem ser destacados, mas vou àqueles que trataram da divulgação de informações sobre prisões.
Um PM, por exemplo, terá de tomar ainda mais cuidado na hora de uma captura: o servidor pode ser condenado de um a quatro anos por ‘constranger um preso a se exibir para a curiosidade pública’ ou ‘constranger um preso a se submeter a situação vexatória’.
Sabe-se lá o que significa isso de fato.
Eu penso que a lei poderia obrigar o policial a pedir desculpas ao prender o criminoso; ou, ainda, uma viatura com ar-condicionado e Coca-Cola para o meliante se deslocar à delegacia ou ao presídio.
Nada mais justo, humano.
Feita a ironia, segue a tragédia.
Outros servidores da segurança pública, do judiciário, do Ministério Público também podem ser punidos.
Felizmente, foi mantido o veto que não permitia o registro de imagens do preso, investigado ou vítima sem consentimento ou mediante constrangimento ilegal.
Ainda que isso tenha ficado de fora, Polícia Civil e Brigada Militar já se posicionaram sobre o ponto: não serão mais produzidos materiais no momento da prisão que possam identificar o preso.
Isso é o medo de que, com a nova lei, a divulgação à imprensa possa gerar processos contra os servidores.
A PC orientou que “não sejam compartilhados ou divulgados vídeos e fotos de presos/investigados/indiciado/conduzidos, de qualquer espécie, ainda que estejam de costas ou que o rosto tenha o efeito desfoque”.
E a medida muda também o trabalho do jornalista.
“Orienta-se não permitir a gravação de reportagens ou imagens do preso/investigado/indiciado para programas de televisão, blogs, redes sociais e afins de cunho sensacionalista em que os presos são expostos, de qualquer modo, à execração pública nas dependências dos órgãos policiais ou fora deles em cumprimento de diligências. Por outro lado, orienta-se solicitar aos órgãos e profissionais da imprensa que não fotografem ou filmem a condução de presos/investigados/indiciados nos locais de busca ou prisão, bem como no órgão policial”.
A Brigada Militar foi na mesma linha:
“Orienta-se também, aos policiais militares, para que não exponham os indivíduos sob sua custódia, de forma gratuita, às equipes de imprensa ou a populares, de forma a contrariar o dispositivo legal retromencionado.”
Fica claro que o debate geral e as leis atuam na proteção dos que cometem crimes.
E isso não apenas no legislativo.
Imaginem vocês que tem até juiz que manda carta de feliz ano novo a presos; ‘filósofa’ que se posiciona a favor do assalto, políticos que defendem homicidas e os trataram como vítimas da sociedade.
Nessa discussão ficam esquecidas as partes principais de uma ação criminosa: a vítima e sua família.
É como se não existissem.
Mortas, feridas, de forma física e/ou psicológica, elas não têm voz.
É a velha e tão falada inversão de valores, que revolta, mas não surpreende quem vive no Brasil.
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